domingo, 12 de julho de 2015

ABDEL-MALEK, Anouar. A dialética social. Petrópolis: Paz e Terra, 1975.

ABDEL-MALEK, Anouar. A dialética social. Petrópolis: Paz e Terra, 1975.

«Uma sociedade não se constrói em torno de "significações", mas das tarefas essenciais sem as quais ela não poderia continuar. E, como indivíduo, a sociedade se esforça em primeiro lugar para sobreviver, para perpetuar sua existência (mais que sua essência). Ela se esforça em seguida (poderíamos chamar isso de suas tarefas secundárias) para maximizar (pela competição e eventualmente pela luta) as vantagens de que gozam seus membros privilegiados quando se trata de uma sociedade hierarquizada. As relações organizadas em torno dessas tarefas (não a consciência nem a teorização dessas relações) repercutem em toda a vida social. Todas as outras formas de relações e de consciência devem adaptar-se a essas relações enquanto que a recíproca não é verdadeira» (ABDEL-MALEK, 1975, p. 112).
«Ora, a ideologia nacionalitária assim como a ideologia religiosa oferecem, no atual estado de coisas, mil possibilidades aos reacionários de se colocarem ao contrário como os melhores defensores da pátria e da religião» (M. Rodinson, In: Islam et capitalisme apud ABDEL-MALEK, 1975, p.119-120).
«O imperialismo é a tentativa que os grandes magnatas da indústria fazem de alargar o canal de escoamento de seu excedente de riqueza, e isso através da procura de mercados estrangeiros e de investimentos estrangeiros (susceptíveis de) absorver as mercadorias e o capital que eles não podem vender ou utilizar internamente» (John A. Hobson, 1902, In: Imperialism: a study apud ABDEL-MALEK, 1975, p. 207).
«A vitória da revolução na China em 1949 marca o ponto de virada de toda a história mundial – ao colocar o Oriente renascente e revolucionário (a área dependente) no centro dos processos de decisão política internacionais» (ABDEL-MALEK, 1975, p. 240).
«O problema da natureza do poder no Estado moderno é, consequentemente, colocado. Os tecnocratas — será preciso lembrar ? — não passam de técnicos, cientistas e administradores. Nas sociedades em que a complexidade é proporcional ao progresso econômico, eles são levados, por inclinação por assim dizer muito natural, a pensar que são os quadros mais qualificados para a gestão, em primeiro lugar, e para a decisão econômica, em seguida; depois disso, tomando consciência da imbricação direta do econômico e do político — apesar das ilusões reconfortantes da separação de poderes, e, mais ainda, da autonomia das esferas da vida social —, é o poder  de decisão política  que lhes parece pertencer-lhes, em termos de mérito e de  qualificação» (ABDEL-MALEK, 1975, p. 253-254).
«A história do poder de Estado no mundo tem sido a da organização sempre mais racional da violência enquanto instrumento da hegemonia das classes e grupos sociais dirigentes no seio do Estado Nacional. [...] A paz civil no interior; a violência contra os inimigos externos e internos. O Estado podia se conceber como o Estado de paz apenas civil. Mas somente às custas de uma verdadeira mutilação ideológica e teórica: a partir do desejo persistente de mascarar a natureza de classe do poder para manter a ficção da divisão do poder, a do primado da liberdade individual formal sobre as liberdades públicas. Daí vem a persistência das teorias idealistas do Estado na época atual» (ABDEL-MALEK, 1975, p. 288-289).
«E a violência, antes identificada com todos os demônios, revela-se ao mesmo tempo como instrumento de morte maciça e o da criação de um mundo novo. Uma vez que ela se integra a uma visão geral do futuro do mundo, a um projeto de civilização, ao fato de as massas tomarem seu destino em suas mãos» (ABDEL-MALEK, 1975, p. 290).
«O Estado e seu aparelho concentram, em suas mãos, um número sempre crescente de conhecimentos, de decisões fundamentais, de organização planificada e orientada de toda a vida social. Por toda parte, de um modo contraditório, porém convergente, os centros não-estatais de decisão parecem ultrapassados pela exigência de racionalidade maximizada, que impõe a centralização, ou seja, o Estado» (ABDEL-MALEK, 1975, p. 292).

«Mas, fundamentalmente, em razão da evolução da estrutura interna das formações socioeconômicas nacionais de nossa época, incluindo-se todas as ideologias, que fez do Estado o centro do poder de decisão em todos os planos da vida social, de sua preservação, assim como de sua evolução, quer se trate de economia, de hegemonia política, de cultura e de ideologia, ou dos modos de vida quotidiana» (ABDEL-MALEK, 1975, p. 293). 

MANACORDA, Mario Alighiero. História da educação: da antiguidade aos nossos dias. 2. ed. São Paulo: Cortez, 1989.

MANACORDA, Mario Alighiero. História da educação: da antiguidade aos nossos dias. 2. ed. São Paulo: Cortez, 1989.

«A escola de gramática e de retórica era, afinal. A escola das classes privilegiadas. Juvenal confirma que a eloquência era algo raro entre esfarrapados (rara in tenui fecundia panno – VII, 45). Exatamente por causa dessa característica de ser uma escola das classes dominantes, ela tornou-se de interesse público e conseguiu o apoio direto do poder político, que primeiramente faz concessões particulares, em seguida provê os salários dos mestres e, enfim, assume também a função de escolas. Da Grécia, em suma, veio não somente a escola, mas também o evergetismo, inicialmente privado e depois de Estado» (MANACORDA, 1989, p. 97).
Em que pese o fato de que, em 1792, segundo Manacorda (1989) «Condorcet sustentava a necessidade de uma instrução para todo o povo, aos cuidados do Estado e inspirada num laicismo absoluto: uma instrução, enfim, “única, gratuita e neutra”» (1989, p. 251). No entanto ele também advertia os bons proprietários de sua época para o fato de que «[...] a Constituição não pode permitir na instrução pública um ensinamento que, afastando os filhos de uma parte dos cidadãos, destruiria a igualdade das vantagens sociais» (apud MANACORDA, 1989, p. 252).
«Uma das manias que podemos considerar dominante em nossos dias na Europa é aquela de querer difundir as luzes sobre todas as classes da sociedade. [...] Faz-se necessário, portanto, que se prescrevam limites à comunicação das luzes na sociedade, porque a ignorância parece reivindicar com autoridade o seu império. É conveniente, portanto, não ocupar-se a instrução da instrução científica daquelas classes da população, condenadas pela indigência a um trabalho mecânico e diuturno. Para elas basta que sejam imbuídas de uma moral pura e santa. O que seria realmente vergonhoso é descuidar da educação da classe nobre, confortada e rica» (Da Educação, p. 205 e 207 apud MANACORDA, 1989, p. 276).
«Os livros fizeram da educação aquilo que nunca tinha sido antes: uma arte ensinada [...] Esse considerar a educação como uma arte que existe de per si e que precisa de métodos para sustentar-se não é antigo no mundo; mas foi ideia dos jesuítas» (CAPPONI apud MANACORDA, 1989, p. 279).
Robert Owen (1771-1858) foi quem, em 1818, ao lado de sua fábrica têxtil de New Lanark, na Escócia, abriu para os filhos de seus operários, «o Instituto para a ‘Formação do caráter juvenil’ que previa classes infantis. Esse instituto é considerado o início da escola moderna da infância, a Infant’s school» (MANACORDA, 1989, p. 280-281).
Pio IX, cujo papado foi de 1846 a 1878, brada contra a educação por propagar «doutrinas pestilenciais, a confusão de erros, a desenfreada liberdade de pensar, de falar, de escrever [condena] os perversos ensinamentos especialmente de filosofia, que enganam e corrompem deploravelmente a juventude, ministrando-lhe fel de dragão no cálice de Babilônia» (PIO IX, Qui plurabis, 1846, p. 266 apud MANACORDA, 1989, p. 272).
«A escola é o instrumento essencial e mais eficaz de progresso e de reforma social. O professor é empenhado não somente na formação dos indivíduos, mas na formação da justa vida social» (DEWEY, 1897 apud MANACORDA, 1989, p. 316).
Em A educação e a ordem social, Bertrand Russel denuncia que, «a educação faz parte da luta para o poder entre religiões, classes e nações, e que, exceto na Rússia, ela é sempre direcionada a favorecer os interesses dos ricos e, em qualquer lugar, ensina uma exclusiva fidelidade ao próprio Estado» (apud MANACORDA, 1989, p. 321).
«São as "especializações", ou melhor, o "fazer", não o fazer guerreiro das antigas classes dominantes, mas o fazer produtivo que não é o camponês ou artesanal, mas a capacidade tecnológica de domínio da natureza, que é um problema insuperável da pedagogia moderna» (MANACORDA, 1989, p. 340).
E como denuncia uma black-music escrita por descendentes de indivíduos sequestrados em África e escravizados no ético Novo Mundo Luterano-Calvinista «Vós construís vossas prisões, vossas escolas, e nos dais uma educação para lavagem cerebral» (MANACORDA, 1989, p. 345), caracterizando assim a educação como mais uma forma de opressão
A ONU no inciso 2, do artigo 26 de sua Declaração, sanciona: «a educação deve ser orientada para o pleno desenvolvimento da personalidade humana e para o fortalecimento do respeito dos direitos do homem e das liberdades fundamentais. Ela deve promover a compreensão, a tolerância, a amizade entre todas as Nações, os grupos raciais e religiosos, e deve favorecer a obra das Nações unidas para a manutenção da paz» (MANACORDA, 1989, p. 354).
«Observe-se que o aprendizado na empresa visa "qualificar o trabalhador para a própria empresa". Até aqui estamos no âmbito puramente operário» (MANACORDA, 1989, p. 343).

«O grande Einstein, que considerava a guerra algo de ignóbil e desprezível, denunciava o fato de que: "o bom senso dos povos e sistematicamente corrompido pelos especuladores do mundo político e do mundo econômico, os quais, para isso, se servem da escola e da imprensa"» (MANACORDA, 1989, p. 355).

LEPAPE, Marie-Claire. Pedagogia e pedagogias. Lisboa: Edições 70. 1975.

LEPAPE, Marie-Claire. Pedagogia e pedagogias. Lisboa: Edições 70. 1975.
«Todas as pedagogias modernas, com efeito, pressupõem unanimemente a possibilidade duma escola libertadora e, apresentando-se elas próprias como portadora duma libertação dos indivíduos, estão animadas da esperança duma vitória final da "liberdade" sobre as pressões sociais ou institucionais » (LEPAPE, 1975, p. 15).
«Hoje, confunde-se a Escola com a educação, como se confundia, outrora, a Igreja com a religião» (LEPAPE, 1975, p. 19).
«E no fim das contas, para que servimos, na escolar, no liceu, na universidade? Nós somos os grandes distribuidores de notas ou de classificações; somos os artífices que preparam para um ofício; qualquer que seja a nossa fidelidade aos programas, somos mais ou menos abertamente, mais ou menos felizmente, constrangidos a assumir as responsabilidades da entrada para o liceu, para a universidade, do bacharelato ou da passagem de um ano num curso superior. E a ter em consideração, nos nossos conselhos de orientação, as estruturas de acolhimento que são oferecidas aos nossos alunos e o número de empregos futuros, em função dos quais se calcula a política de educação e se valorizam ou desvalorizam concursos e exames» (LEPAPE, 1975, p. 27-28).
«De tal sorte que a relação professor-aluno reduzir-se-ia à relação de "lesa-criança" e que a única salvação seria o apocalipse: "Crianças, escreveu Jules Celma, se virdes um professor ferido, matai-o". Esse apelo ao assassinato (simbólico) do pai que reveste, sem dúvida, no clima repressivo atual da escola, uma virtude polêmica vivificante e qualidades humorísticas manifestas anima aquilo que, nos liceus e nas universidades, se chama a "luta antiautoritária"» (LEPAPE, 1975, p. 29).
«Na prática concreta da nossa função aceitamos, como evidências inabaláveis, as próprias condições do exercício do nosso trabalho: "intelectuais" destinados a formas o sentido crítico dos alunos e a modelar-lhes um espírito belo» (LEPAPE, 1975, p. 33).
«Na República de Platão, a educação é codificada em leis estáveis e rígidas, que os cidadãos não têm nem o gosto, nem o poder de pôr em questão, as quais têm em vista formar os indivíduos no respeito e na manutenção» (LEPAPE, 1975, p. 38-39).
«Em todos os casos deste gênero — isso é, em todos os casos onde um "corpo" docente, persuadido do valor da cultura que difunde e do caráter moral da seleção que pratica, toma a seu cuidado alunos bem condicionados nos mesmos cultos e vivendo, como uma ascese moral, as exigências, as exigências disciplinares do trabalho escolar — a pedagogia não se pode definir senão em relação a uma tradição repetida e reproduzida bastante ritualmente, para ganhar, na força de sua repetição, o estatuto venerável dos ideais eternos» (LEPAPE, 1975, p. 40).
«A inteligência escolar é, com efeito, o sinal de paciência dos "melhores" para suportarem a distância das etapas intermediárias entre a ignorância (do aluno) e o saber (do professor-adulto); paciência das repetições e das recitações de cor; paciência dos exercícios; o exercício é um trabalho sem criação; um exercício "de aplicação" (em todos os sentidos do termo), um exercício de "controle" (em todos os sentidos do termo, também). Paciência na aceitação da disciplina: o bom aluno nunca tem problemas com a administração; traz sempre a sua bata; nunca é "insolente" para com os professores (a insolência e o mau espírito são as duas taras do "mau" aluno). Paciência no modo de esperar a "vida": trabalhar não é brincar; a prova disso é que o desejo de saber (dos "bons") é oposto ao saber do desejo. [...] É certo, sem dúvidas, que as qualidades escolares não podem pactuar com a revolta. Nesse sentido, pode dizer-se que a pedagogia é "a educação moral das crianças" e que o ensino tem por função renovar as condições da existência duma sociedade e perpetuar-lhe os valores, dos quais assegura o reconhecimento» (LEPAPE, 1975, p. 42-43).
«A indústria vai buscar à ciência o que é útil, o que aumenta a sua eficiência: a técnica científica utiliza as descobertas, segundo as exigência das suas necessidades, necessidades essas determinadas pelas leis da concorrência e do mercado» (LEPAPE, 1975, p. 48).
«Todas as seleções operadas sobre os candidatos, a partir da escola primária, são impotentes para demonstrar que um "saber" foi bem "adquirido" ao longo da escolaridade. E isso mesmo ao nível elementar da lógica da frase, da ortografia gramatical (não falemos da ortografia de uso), da propriedade dos tempos. Ainda menos da precisão de conhecimentos» (LEPAPE, 1975, p. 56-57).
«[...] A classificação faz-se em função da maior ou menor facilidade em reproduzir modelos predeterminados. A linguagem que dimana da espontaneidade é, logicamente, inclassificável» (LEPAPE, 1975, p. 64).
«Porque, também, esse controle das aquisições é inseparável da função de seleção da escola que, prepara direta ou indiretamente para a profissão, tem por função renovar as forças produtivas duma nação e responder, mais ou menos diretamente, à solicitação dos lugares a preencher» (LEPAPE, 1975, p. 65).
«A educação tem por objetivo a efetivação da sociedade política que a organiza» (LEPAPE, 1975, p. 139).
«A linguagem que o professor fala não é uma linguagem libertada.[...] Desse modo, a nossa ação pedagógica será sempre, forçosamente, limitada: diante do sistema tradicional  de ensino, que demonstra cada vez mais sua incapacidade de adaptação aos movimentos sociais aos movimentos da população escolar, e cujo caráter repressivo a crise atual da escola faz realçar, apercebemos mais facilmente de que a linguagem pedagógica é a de uma elite intelectual, que perpetua e reproduz os valores e tabus da classe dominante; o professor tradicional aparece, sem dificuldade, como "cão de guarda", ainda que não fosse senão pelo seu apego à imutabilidade das normas, à cultura clássica, à seleção. Mas a humanização do saber e a personalização da sua transmissão, que são características das pedagogias novas, não seriam capazes de apagar a realidade social da linguagem. A escola, certamente, pode corrigir a influência do meio, mas não a pode suprimir» (LEPAPE, 1975, p. 66-77).
«Por uma feliz escolha, que dos próprios conhecimentos, quer dos métodos para ensiná-los pode instruir-se toda a massa dum povo, de tudo aquilo que um homem tem necessidade de saber para a economia doméstica, para a administração dos seus negócios, para o livre desenvolvimento do sue talento e das faculdades, para conhecer, defender e exercer os seus direitos; para der instruído sobre seus deveres, a fim de poder bem cumpri-los, para julgar as ações dos outros, com as próprias luzes, e não ser estranho e nenhum dos sentimentos elevados ou delicados que honram a natureza humana» (CONDORCET apud LEPAPE, 1975, p. 79).
«Professor – dizia durante a III República (dirigindo-se ao professor primário), Léon Bourgeois, presidente da Liga do ensino — tu és o depositário do tesouro intelectual e moral, pelo qual se fez a unidade da consciência humana… Tu és o representante da razão. Tu és o representante da ideia nacional e da consciência social. Tu és, em cada aldeia, não apenas o intérprete das ideias comuns, mas o homem cuja presença é suficiente para manifestá-las. Tu exerces uma espécie de magistratura dos costumes» (IDA BERGER & ROGER BENJAMIN, 1964, p. 51 apud LEPAPE, 1975, p. 85).
«Ainda que tentemos falar menos do que o habitual, nao deixa de ser menos verdade que o nosso trabalho situa-se no domínio da palavra. A linguagem da investigação científica refere-se a experiências reais, que lhe servem de caução objetiva e que são garantias de verdade. A linguagem do pedagogo refere-se, por sua vez, a um saber adquirido durante o período de formação intelectual dos professores, a qual pode ser enriquecido no decorrer de reciclagens, mas não tem possibilidades, por causa das urgências da profissão, de ser penetrada por novos conceitos e por novos métodos da ciência que se venham a constituir. Desde modo, o pedagogo permanece preso, na sua função, a estrutura mentais, linguística e lógicas herdadas dos seus mestres. A verdade dos seus conhecimentos, administrativamente  garantida pelos seus diplomas, e praticamente confirmada pela situação de professor — a qual lhe confere uma superioridade, no plano dos conhecimentos, sobre os alunos — não encontra, de fato, fundamento "objetivo" senão no manual escolar, ou num saber adquirido no passado» (LEPAPE, 1975, p. 99-100).
«O Emílio não é um discurso universal a respeito da infância ou sobre a natureza humana. Antes é um tratado de educação em que preponderam duas preocupações básicas, a saber: é imperativo antes de tudo formar o cidadão no respeito de uma igualdade democrática definida pelo Contrato Social; e, a seguir fazer do discurso pedagógico, um discurso verdadeiro, isso é, que já não se encontre em evidente desacordo com a teoria da ciência que surge no século XVIII» (LEPAPE, 1975, p. 119). «Neste sentido, o Emílio, por exemplo, aparece, na obra de Rousseau, como um complemento indispensável do Contrato social. O objetivo da sua pedagogia é a formação do cidadão soberano e do sujeito ao mesmo tempo, o qual se destina a obedecer às leis da cidade, mas também a dar provas de iniciativa e de responsabilidade» (LEPAPE, 1975, p. 136).
«Com efeito, as linguagens da educação são muito mais extensas do que a linguagem da escola. A linguagem pedagógica não se limita ao pedantismo escolar: estende-se a todo um conjunto de sinais, que excedem largamente as palavras dos livros» (LEPAPE, 1975, p. 120).
«De tal sorte que, se a racionalidade do objetivo da educação deve ser definida como política de educação duma dada sociedade (não somente pelo sistema de ensino, mas pelo conjunto dos valores educativos), a relação do professor e do aluno não se vive em função dessa política de educação, mas como uma relação psicológica de amor e de ódio, de autoridade e de obediência, de amizade e de tolerância, de entusiasmo ou de tédio, de confiança ou de desconfiança», [mesmo porque] «o comportamento do professor é definido formalmente pela instituição de ensino, que fixa o conteúdo do ensino (os programas), o estilo de autoridade (as instruções oficiais e a organização da disciplina) explicita ou implicitamente» (LEPAPE, 1975, p. 145).
«Uma mudança de métodos e de programas aparece, em geral, como resposta a uma necessidade e inscreve-se numa reforma destinada a reajustar, a atualizar a escolar, que por si própria parece ter uma tendência para o imobilismo e para a repetição» (LEPAPE, 1975, p. 147).
«Mas ao mesmo tempo, a escola, enquanto instituição do Estado reveste pela sua natureza um caráter de universalidade, não só porque deve receber toda a gente, ao menos no plano teórico da igualdade do direito à instrução, mas também porque tem por finalidade transmitir o patrimônio cultural universal. Nessas condições, a escola não transmite apenas valores éticos, mas também científicos, que fazem parte da herança cultural» (LEPAPE, 1975, p. 151).
«Sabemos também que a ciência não pertence ao povo, mas que faz parte da herança dos ricos. Estamos cientes, igualmente de que os "pobres" da escola não recebem em herança senão a sombra da ciência» (LEPAPE, 1975, p. 153).
«A ideologia carismática da pedagogia universitária faz aparecer esta pedagogia como uma defesa dos privilégios, de tal sorte que a ciência (que não poderia se considerar por si mesma burguesa) é ensinada através duma linguagem que, no fim de contas, só se dirige aos burgueses; e o caráter científico do saber ensinado apenas serve, afinal, para instalar estudantes e professores no sono da boa consciência. […] A ciência é, afinal, o dom do céu (ou do mérito) que justifica o privilégio social» (LEPAPE, 1975, p. 162-163).
Há, por assim dizer, o mal-estar da pedagogia, pois «os conteúdos do ensino universitário, por mais científicos que sejam não podem deixar de estar situados, enquanto conteúdos pedagógicos, num setor do ensino sociologicamente determinado, muito estreitamente ligados à ética da universidade burguesa» (LEPAPE, 1975, p. 166).
«A educação, que deve reproduzir os valores humanos de uma sociedade, mesmo respondendo às suas necessidades econômicas, organiza-se segundo uma teoria da infância e das relações da criança e do adulto, a qual se modela consoante os valores culturais duma época» (LEPAPE, 1975, p. 170).
«Desse modo, a autoridade legitimadora da escola pode redobrar as desigualdades sociais, porque as classes mais favorecidas, demasiado conscientes do seu destino, e demasiado inconscientes das vias pelas quais o mesmo se realiza, contribuem com isso para a realização» (BOURDIEU & PASSERON, 1964 apud LEPAPE, 1975, p. 182).
«Todas as pessoas falam; mas as que pertencem a meios socioculturalmente favorecidos, dominam melhor a linguagem do que as outras, justamente em razão da influência do meio» (LEPAPE, 1975, p. 197).
«A necessidade de brincar é isso que nos vai permitir reconciliar a escola com a vida, fornecer ao aluno esses móbiles de ação que se pensava ser impossíveis de encontrar numa sala de aula. Qualquer que seja a tarefa que queirais mandar fazer a uma criança, se encontrastes um meio de lha apresentar, de maneira que ela perceba como um jogo, essa tarefa será capaz de libertar, em proveito da criança, tesouros de energia. O jogo é duma importância capital para a realização da escola ativa» (CLAPARÈDE, 1946 apud LEPAPE, 1975, p. 218).
«Nessas condições, o pedagogo, ocupado, em nome da ciência ou em nome d amoral, em reformas organizacionais no interior da escola, fica prisioneiro da sua própria experiência, mantendo-se num estado mais ou menos consciente de "cegueira institucional", e tende a erigir em absoluto a própria ideia de reforma pedagógica» (LEPAPE, 1975, p. 223).
«Quando os diálogos, ou "discussões", ou "lições" começam e acabam com a campainha, que pontua as nossas horas de presença física e as nossas horas de discursos; quando nos "desenvolvemos", como plátano do pátio, entre quatro paredes de tijolos, apenas permeáveis ao ruído dos caminhões, e quando se propaga a psicose do exame final, põe-se a questão de saber se, nalgum feliz dia, poderemos encontrar, nestes velhos casarões, alguma pessoa "humana"» (LEPAPE, 1975, p. 226).
«Tenho pouca simpatia pela ideia bastante generalizada de que o homem é fundamentalmente irracional e que seus instintos, se não forem controlados, conduzirão à sua própria destruição e à destruição dos outros» (ROGERS, 1967 apud LEPAPE, 1975, p. 228).
«Georges Lapassade chama a "burocracia pedagógica", isso é, o conjunto da Administração, das instruções oficiais, dos programas, dos regulamentos que situam o trabalhador do ensino debaixo da estrutura hierárquica duma autoridade repressiva» (LEPAPE, 1975, p. 235).
A modernidade exige um novo homem. «Ora é estranho que este humanismo seja reinvidicado com força por todos os especialistas do management e da gestão das empresas: a evolução da economia de mercado, o crescimento do consumo e as transformações técnicas da indústria moderna, complicando a adaptação dos homens a um trabalho que ultrapassa os limites duma especialização elementar e adquirida de uma vez para sempre, originaram um homo novus; moldado pela cibernética e pela felicidade personalizada, este homem novo é otimista, reciclado, eficaz e cheio de iniciativa. Numa palavra livre» (LEPAPE, 1975, p. 238-239).
«É a diretividade que dá origem à agressividade, é a disciplina que cria a indisciplina» (LEPAPE, 1975, p. 227).
«Na idade da eletrônica e da cibernética, a civilização é mais do que nunca mecânica, mas começa a ensinar à maquina a copiar a inteligência do homem e, nisso, ela já não é completamente mecanicista. Resta-lhe reensinar o homem a ser ele próprio» (DE PERETTI, 1967 apud LEPAPE, 1975, p. 239).
«Chega-se a esquecer o uso industrial da psicologia, que é uma arma eficaz de seleção e de integração e que contribui para tudo menos para a libertação do indivíduo» (LEPAPE, 1975, p. 240).
«Esquecem-se, assim, demasiado facilmente as dificuldades socioculturais dos alunos, o absurdo duma certeza formação intelectual dos professores que faz com que ignorantes ensinem a ignorantes, e a questão da eficácia dos métodos pedagógicos» (LEPAPE, 1975, p. 244).
«A finalidade primária da educação é cultural. E a questão pedagógica começa com a da transmissão dum saber que tem em vista a socialização do indivíduo e a sua preparação para a profissão. As reações individuais não podem ser isoladas em relações existenciais porque, na relação pedagógica, as reações individuais são condicionadas e fabricadas pelo modo de transmissão da sua própria cultura por uma sociedade» (LEPAPE, 1975, p. 244).
«A tarefa educativa exige um concurso de forças: a equipe administrativa, as equipes de "vigilância", os inspetores, o próprio ministério e seus representantes, cooperam com os professores, com vista a realizarem o seu objetivo comum, que é a educação e a instrução dos alunos» (LEPAPE, 1975, p. 246).
«Como se a não-diretividade trouxesse em si todos os germes anárquicos (no sentido de destruidores) que abalariam os alicerces do nosso pobre mundo! Como se o desprezo, por parte de alguns, do seu poder, fosse a destruição de todo o poder» (LEPAPE, 1975, p. 249)!
Dificuldade lembrada por Lapassade: «Como conciliar a renúncia à diretividade com a necessidade de transmitir à criança os conhecimentos de base (escrita, leitura, aritmética) que permitem a sua participação na cultura? Como conciliar não-diretividade e escolarização? [...] A escolarização é transmissão: ela parte da ignorância da criança, para transmitir-lhe instrumentos culturais. [...] O papel do pedagogo é, em princípio, duplo: instruir e educar. É a instrução que parece necessariamente diretiva; mas nem por isso se disse que a educação seja transmissão. Pode-se ter em vista transmitir os valores; pode-se ensinar sem se julgar obrigado a ensinar uma sabedoria» (LAPASSADE, 1963 apud LEPAPE, 1975, p. 250-251).
«Mas a pedagogia libertaria sustenta que a desordem não é uma negação: produz o efeito duma "descarga", duma "desintoxicação", necessárias ao exercício da liberdade. A pedagogia libertaria dá um sentido existencial à revolta» (LEPAPE, 1975, p. 260).
«A escolar é impotente para mudar a sociedade, ou para preparar, como pretende, o mundo do amanhã» (LEPAPE, 1975, p. 267).
«Uma liberalização pedagógica pode aparecer como perigosa, porque parece dever produzir, num prazo mais  ou menos longo, nos alunos formados na autonomia ou na autogestão da sua aprendizagem, a recusa mais ou menos violenta da estrutura hierárquica das relações de trabalho e das relações sociais» (LEPAPE, 1975, p. 289).
«Ainda que a escola transmita mais equitativamente a cultura, ela tem por efeito bloquear, inibir o desenvolvimento da personalidade infantil» (LEPAPE, 1975, p. 296).
«A escola destrói as próprias bases, sem as quais nenhuma personalidade adulta pode construir-se [...] Àquele, a quem se proíbe ser ele próprio e crescer, nada lhe resta senão sonhar» (MENDEL, 1969 apud LEPAPE, 1975, p. 297).
«A maior parte das pedagogias novas não são mais do que o reflexo dos arranjos éticos da "modernização", do "progresso", dos direitos e das responsabilidades do cidadão das repúblicas modernas: por isso elas podem ser facilmente "digeridas" pelas instituições e institucionalizar-se no molde de reformas sucessivas» (LEPAPE, 1975, p. 308).
Colocando-nos, por exemplo, sob a perspectiva de Baudelot e de Estabelet, podemos afirmar «que a escola corresponde perfeitamente ao que o sistema político atual espera dela, pois que, na sua rede de ação pobre, ela não tem outra coisas a difundir além do respeito pela cultura e o contentar-se com sua sorte, e na rede de ação rica, transmite adequadamente a cultura burguesa aos herdeiros da burguesia» (LEPAPE, 1975, p. 309).
«Vede — explicava-nos o proprietário duma criação moderna de frangos — tudo está previsto, tudo é metódico e científico. A nossa criação — no fim das contas, é um pouco como uma escola — foi dividida em classes. Estes pintinhos arrepiados que acabam de chegar, saídos dos ovos da chocadeira, estão neste primeiro compartimento aquecido e superaquecido. À medida que vão crescendo, desdobramos as gaiolas; mudamo-las de compartimento. Anotamos muito particularmente a alimentação que é adaptada a cada idade, e que é ci-en-ti-fi-ca-men-te estudada, com vitaminas que custam 100.000 o grama! Num tempo record, os frangos crescem e engordam. Ouvi-os, nestes últimos compartimentos, brigando e gritando como crianças no recreio, num campo demasiado pequeno para suas brincadeiras! — E se os pusessem em liberdade? Diz um rapazinho oprimido por esta atmosfera de campo de concentração para as galinhas. — Nenhum perigo existiria: se, por acaso eles abandonassem a sua gaiola, não poderiam nem andar, nem encontrar alimento. Estão feitos para ficar acolá no seu lugar, a debicar o alimento e a esperar o cutelo do sangrador... Lá em baixo, à volta das quintas, galinhas e galos em liberdade, tagarelavam pacificamente, passeando debaixo das oliveiras. Mais longe, na orla do bosque de pinheiros, uma perdiz chama os filhotes para pô-los em segurança, antes do crepúsculo. Não tirarei conclusões. Mas, pobre de mim! Eu penso que há ainda escolas preparadas e ordenadas cientificamente segundo os princípios da criação moderna de frangos, e que os alunos que dela saem, também eles se arriscam a não saber, nem a andar no mundo, nem procurar e conquistar o seu alimento. Esperarão, também eles, o alimento e o cutelo dos sangradores...» (FREINET, 1967 apud LEPAPE, 1975, p. 313-314).
«Todas as éticas pedagógicas modernistas partem duma valorização do saber, portanto, da ideia implícita da superioridade moral do trabalho intelectual. Ora, donde vem a ideia, senão da própria escola, que não faz, nesse caso, senão traduzir a divisão do trabalho» (LEPAPE, 1975, p. 312-313)? -- «De modo nenhum é evidente que o trabalho intelectual seja particularmente libertador: não somente vemos todas as reivindicações libertárias formularem-se contra o saber, mas ainda a comunicação pedagógica do saber, que é profundamente inculcação do respeito e transmissão de valores, representa um fator importante de condicionamento» (LEPAPE, 1975, p. 313).
Também é bom que se diga que «se a escola atirou o trabalho para a classe das coisas desprezíveis ou anexas, se reserva os tempos livres do estudo para aqueles que não "trabalham", se reduziu a delicadeza que consentiu ao trabalho, à fabricação folclórica de cestos de vime e à confecção de roupinhas, é porque queria preservar as suas elites da nódoa manual. Pelo contrário, uma pedagogia "popular" deve reconhecer o trabalho como único criador de valor e escolhê-lo como centro» (LEPAPE, 1975, p. 351).
«A finalidade primária da educação é cultural. E a questão pedagógica começa com a da transmissão dum saber que tem em vista a socialização do indivíduo e a sua preparação para a profissão. As reações individuais não podem ser isoladas em relações existenciais porque, na relação pedagógica, as reações individuais são condicionadas e fabricadas pelo modo de transmissão da sua própria cultura por uma sociedade» (LEPAPE, 1975, p. 244).
«[…] A escola destrói as próprias bases, sem as quais nenhuma personalidade adulta pode construir-se […] Àquele, a quem se proíbe ser ele próprio e crescer, nada lhe resta senão sonhar» (MENDEL, 1969, p. 160 apud LEPAPE, 1975, p. 297). In: MENDEL, Gérard. La révolte contre le père. Payot, Paris, 1969.Reconhece-se o conservadorismo ora estabelecido em todas as instituições do sistema de educação, «deste modo, o primeiro trabalho pedagógico consiste em combater preconceitos sobre a ciência e a cultura em nome da verdade e da razão» (LEPAPE, 1975, p. 310) por meio da crítica.
«Chega-se a esquecer o uso industrial da psicologia, que é uma arma eficaz de seleção e de integração e que contribui para tudo menos para a libertação do indivíduo» (LEPAPE, 1975, p. 240).
Fernand Deligny (1970), que recusa qualquer método a priori, nos diz em «Le groupe et la demande», In Les vagabonds efficacies et autres récits, Maspéro, Paris, 1970, (p. 159-161), ao praticar uma pedagogia que parte da revolta aberta ou latente dos deliquentes e psicóticos de La Grande Cordée, como único começo possível duma intervenção educativa, sua «experiência mostra que o pedido de liberdade não é espontâneo: é revelado pela pedagogia libertária, que pode, por contraste, fazer tomar consciência do caráter repressivo de imposições que são evidentemente repressivas, como o asilo ou a prisão» (LEPAPE, 1975, p. 266), [Como em Foucault?]. No entanto na escola ora estabelecida os alunos que a frequentam portam-se em conformidade com as normas estabelecidas, qual seja, de uma forma puramente verbal. De toda sorte, importa reconhecer que «a escola tem em suas mãos meios de repreensão poderosos (desde a má nota, à exclusão pura e simples, passando por toda a espécie de castigos) para limitar as revoltas. De tal sorte que parece predominar na escola mais o pedido de "disciplina" do que o pedido de liberdade, graças ao puritanismo educativo maioritário dos professores e aos princípios educativos e escolares maioritários dos pais (que valorizam o sucesso e a disciplina escolares, nos quais vêem o prolongamento verdadeiro da educação familiar)» (LEPAPE, 1975, p. 266-267).
«Por outro lado já se definiu a alienação social por uma fórmula: "o sujeito está sempre noutro lugar". O homem é manipulado por uma grande mecânica: "farás tal trabalho", "é preciso ter visto…, é preciso ser assim… é preciso ter… é preciso"». Nós encontramos o impagável estilo pedagógico […] Aqueles que pretendem formar, não "seres para" mas "seres", provocam um legítimo escândalo: são tão perigosos para a ordem social como para o equilíbrio afetivo dos indivíduos. Seremos utopistas? Não o sabemos. A nossa oferta responde a um outro pedido que ainda não se exprime — que se exprimirá — talvez (VASQUEZ e OURY, 1971, p. 269 apud LEPAPE, 1975, p. 319). In: VASQUEZ, Aida e OURY, Fernand. Vers une pédagogie institutionalle, Maspéro, Paris, 1971.
«A escola teve sempre tendência para considerar o corpo e os desejos como maus; visão maniqueísta da cultura, que reforça o seu caráter opressivo e mistificador: o respeito pela cultura encontra a sua origem na escola que quase não dá lugar aos prazeres temporais, na ideia do pecado original — a profissão do ensino torna-se então uma espécie de demonstração ascética (que se traduz através de todas as formas de castração vestimentária, linguística, moral) da dificuldade de aceder ao saber e ao mesmo tempo, a mentira duma liberdade que só se adquire ao nível do espírito, mentira bastante desmistificadora nas classes dominantes para que se possam a ela acomodar mas que contribui para esmagar os outros» (LEPAPE, 1975, p. 341).
Há que se ter uma tomada de posição no sentido de recusar o paternalismo bem como o desejo de domínio sobre os educados e da mesma maneira o educador tem de libertar-se de seus a priori éticos e políticos para, enfim, «[...] reencontrar a realidade das coisas, escondida, deformada sob a ilusão das palavras, das concepções e dos sistemas» (FREINET apud LEPAPE, 1975, p. 343).
«O sacerdote pode ser absolutamente sincero, o homem de ciência, convencido de que serve a humanidade com suas laboriosas descobertas, o filósofo, que aprofunda cada vez mais o conhecimento do homem, o educador, que recebeu, adquiriu e dispensa uma cultura elevada, humana e profundamente útil à elevação social. Apesar de tudo, tanto uns como outros podem enganar-se, não no pormenor, nem na forma por assim dizer primária da sua tarefa, mas na própria concepção, na origem e na direção superior desta cultura de que eles se julgam os computadores e os mestres e que afinal não é mais do que uma máquina de exploração ao serviço das forças do mal que muitas vezes dirigem as reações» (FREINAT, 1967, p. 65 apud LEPAPE, 1975, p. 342). [In: FREINAT, Celestin. L’éducation du travail, Delachaux et, Niestlé, Neuchâtel, 1967] A pedagogia tradicional na qual «as instituições se impõem como um sistema que não poderia ser posto em causa, como um suporte julgado indispensável do ato pedagógico» (LAPASSADE, 1970, p. 223 apud LEPAPE, 1975, p. 361).
«Os pais de família outrora, como ainda hoje, não diziam aos seus filhos: Estuda, porque assim tornar-te-ás melhor; será um filho mais dedicado e um cidadão fiel… mas unicamente: estuda, meu filho, deixa-te penetrar por esta ciência que fará de ti um Senhor; sempre será menos duro, para comeres o teu pão, do que a cavar a terra. Hoje, é ainda mais simples: a instrução apresenta-se aos pais como uma necessidade técnica e social» (FREINAT, 1967, p. 75 apud LEPAPE, 1975, p. 344).
«Este nível que a sociologia da educação pode esclarecer o pedagogo: a escola, tal qual é, tende a reproduzir as relações sociais, subtraindo-se, sem resolver o problema das desigualdades socioculturais. Pode-se dizer que se a função da escola é a reprodução dessas desigualdades, essa função é quase racionalmente desempenhada pela escola atual na qual o sistema dos exames, o sistema da seleção e da orientação e, no seu conjunto, a linguagem pedagógica, contribuem mais para transmitir uma herança do que para difundir uma cultura» (LEPAPE, 1975, p. 358).
«A pedagogia tradicional contribui para manter o conservantismo social e político, mediante todo o sistema de valores veiculado menos pelos conteúdos do que pela linguagem pedagógica e pela relação com o saber que o mesmo sistema pressupõe. Pela sua dependência dum certo sistema de ensino, toda a pedagogia (que, a não ser que se exerça utopicamente, não pode deixar de ter em conta a seleção dos alunos, o sistema de exames, as passagens de classe e a estrutura pedagógica do estabelecimento no seu conjunto) terá de ser cúmplice deste conservantismo» (LEPAPE, 1975, p. 370).
Lapassade e Lourau elegem a intervenção direta sobre o plano político e assinalam que «a pedagogia institucional pretende para si uma estratégia política (a antipedagogia), não no sentido em que um pedagogo institucional "faria política na aula", mas no sentido em que a autogestão pedagógica é um projeto abertamente político; a autogestão não diz respeito, como alguns a concebem, à simples personalização das aquisições, mas à própria organização do grupo. A autogestão pedagógica é uma luta direta (ainda que sob a forma de conluio) contra o poder, do qual se pensou, durante algum tempo, que era radicalmente incapaz de "recuperar" este projeto abertamente revolucionário (LEPADE,1975, p. 371): «o critério fundamental (segundo o qual o sistema administrativo é burocrático) é a resistência à autogestão pedagógica, isto é, a educação a cargo dos alunos» (LAPASSADE, p. 209 apud LEPAPE, 1975, p. 371).
«[…] A escola destrói as próprias bases, sem as quais nenhuma personalidade adulta pode construir-se […] Àquele, a quem se proíbe ser ele próprio e crescer, nada lhe resta senão sonhar» (MENDEL, 1969, p. 160 apud LEPAPE, 1975, p. 297).
«O problema pedagógico não pode, portanto, pôr-se ao nível das relações interindividuais, nem das relações pessoais do professor e do aluno; não pode, de igual modo, pôr-se em termos de afetividade já que o grupo e, no sentido original do termo, instituidor: o problema pedagógico não é, portanto, senão um problema político» (LEPAPE, 1975, p. 365), no qual «a dependência do sistema de ensino e da pedagogia implícita que nele se perpetua através duma espécie de rotina, relativamente à estrutura das relações de classe» (LEPAPE, 1975, p. 369-370).
«A pedagogia tradicional contribui para manter o conservantismo social e político, mediante todo o sistema de valores veiculado menos pelos conteúdos do que pela linguagem pedagógica e pela relação com o saber que o mesmo sistema pressupõe. Pela sua dependência dum certo sistema de ensino, toda a pedagogia (que, a não ser que se exerça utopicamente, não pode deixar de ter em conta a seleção dos alunos, o sistema de exames, as passagens de classe e a estrutura pedagógica do estabelecimento no seu conjunto) terá de ser cúmplice deste conservantismo» (LEPAPE, 1975, p. 370).
Lapassade e Lourau elegem a intervenção direta sobre o plano político e assinalam que «a pedagogia institucional pretende para si uma estratégia política (a antipedagogia), não no sentido em que um pedagogo institucional "faria política na aula", mas no sentido em que a autogestão pedagógica é um projeto abertamente político; a autogestão não diz respeito, como alguns a concebem, à simples personalização das aquisições mas à própria organização do grupo. A autogestão pedagógica é uma luta direta (ainda que sob a forma de conluio) contra o poder, do qual se pensou, durante algum tempo, que era radicalmente incapaz de "recuperar" este projeto abertamente revolucionário (LEPADE,1975, p. 371): «o critério fundamental (segundo o qual o sistema administrativo é burocrático) é a resistência à autogestão pedagógica, isto é, a educação a cargo dos alunos» (LAPASSADE, p. 209 apud LEPAPE, 1975, p. 371). A autogestão é a única solução "revolucionária" dum poder, cujo conservadorismo se mantém pela burocracia; não sendo a burocracia pedagógica senão um caso particular da burocracia em geral, ou seja, "tudo o que se opõe à autogestão da produção e da vida social, isto é, a passagem da propriedade privada da organização, para a propriedade coletiva".  Nessas condições, a pedagogia é diretamente, abertamente política; e a sua verdade é a organização e a instituição» (LEPAPE, 1975, p. 370-371).
«O modo de comunicação pedagógica, que se justifica sempre em nome da ciência ou da cultura, é de fato o veículo dos valores da burguesia, que se exprime pela ideologia do dom, pelo jogo do sério, pelo aluno brilhante, e por todas as ambiguidades pedagógicas do ensino de "elite"» (LEPAPE, 1975, p. 384).
«A única pedagogia do futuro que hoje possamos ter em vista, não pode nascer senão da desordem existente, onde se enfrentam, na mais perfeita confusão, um conservantismo cada vez mais desagregado, o idealismo maia arrojado e uma forma terrorista do cientismo, que rivalizam em ineficiência, porque nem uns, nem outros encontram uma solicitação social suficiente a que recorrer. Como se as contradições sociais tivessem anunciado o fim das pedagogias mentirosas, sem poderem produzir a pedagogia explícita» (LEPAPE, 1975, p. 390-392).
«O feudalismo teve a sua escola feudal; a Igreja teve a sua educação especial; o capitalismo originou uma escola bastarda, com o seu palavrório humanista a esconder a sua timidez social e a sua imobilidade técnica» (FREINET apud LEPAPE, 1975, p.392).
«Separando a formação intelectual da evolução das técnicas de comunicação, permanecendo afastada do mundo trabalho, ela dá crédito ao respeito do "especialista"  e da inteligência abstrata, em nome da cultura geral. O conservantismo social, em nome da cultura geral, à qual está ligado politicamente» (LEPAPE, 1975, p. 392). «Desintelectualizar a linguagem pedagógica não consiste em substituir o trabalho escolar pelo jogo ou pelo divertimento, mas em deixar de fazer da palavra do professor uma proeza de alto voo, um modelo inacessível e respeitável. E, para isso, não basta que o professor revele retoricamente as suas receitas» (LEPAPE, 1975, p.392-393).